A dinâmica da Covid-19 na cidade de São João del-Rei: análise das médias semanais, casos confirmados e óbitos por bairros
André Barbosa Ribeiro Ferreira[1]
Márcio Toledo[2]
Murillo Gonçalves Santos[3]
A pandemia de Covid-19 constitui um grave problema de saúde pública e o Brasil é um dos países com maior número de casos e óbitos relacionados a essa doença. Assim, compreender sua dinâmica no espaço é fundamental para seu devido controle.
A Geografia da Saúde contribui significativamente para entender a evolução da pandemia no contexto socioespacial ao longo do tempo. Partindo desta afirmação, a dinâmica da Covid-19 na cidade[4] de São João del-Rei foi analisada durante 53 Semanas Epidemiológicas (SE) (um ano) após a confirmação do primeiro caso registrado no município. Foram relacionados, também, os dados diários do boletim epidemiológico municipal e os Decretos Municipais publicados nesse período. Foram analisadas a incidência de casos e a mortalidade em cada bairro, assim como as informações demográficas e socioeconômicas obtidas pelo último Censo Demográfico (2010).
O estudo completo encontra-se em avaliação por pares, às cegas, em revista indexada, portanto, esta nota técnica apresenta de forma sintética os resultados obtidos.
Primeiramente, e não diferente de outras cidades, sobretudo nas capitais brasileiras, os primeiros registros de Covid-19 em São João del-Rei apresentaram histórico recente de viagem internacional. Estes registros ocorreram nos dias 24 e 27 de março de 2020, sendo, respectivamente, o primeiro e o segundo caso confirmado.
Em 17 de abril de 2020, o Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde reafirmou, para São João del-Rei, a condição de transmissão comunitária, já declarada em nível nacional pelo Ministério da Saúde, em 23 de março de 2020. Um mês depois, em 17 de maio, a cidade apresentava 16 casos e um ano após a confirmação do primeiro caso, 3691 infectados e 71 óbitos relacionados a Covid-19.
O aumento do número de casos ocorreu sem grandes picos até a 22.ª SE (30/05/2020), com Média Móvel Simples (MMS) máxima de 1,7 e o total de 37 casos (Figura 1). Entre a 23.ª e a 24.ª SE (24/05 e 06/06), o número de casos positivos da doença aumentou 53%, o que elevou o total de casos para 89 e a MMS para 4,42. Na 25.ª SE, mais 69 casos foram confirmados, totalizando 158 contaminados. Observa-se que houve um aumento de 78% em uma semana. Infere-se que este aumento esteja relacionado à flexibilização das medidas restritivas.
Figura 1: Aumento do número de casos de Covid-19 em São João del-Rei por Semana Epidemiológica (2020-2021). Fonte: Boletim Epidemiológico. Elaboração: Autores, 2021.
De modo geral, o estudo identificou que os aumentos e reduções da MMS estiveram diretamente relacionados aos Decretos Municipais de flexibilização e restrição de atividades. Uma das maiores confirmações desta afirmação é o pico na 53.ª SE, resultado do Decreto Municipal n.º 8.989, publicado mas recentemente excluído do site da Prefeitura Municipal.
O referido decreto autorizou a realização de eventos com até 500 pessoas e foi publicado 9 dias antes das Eleições Municipais. Ressalta-se que, antes disso, a curva encontrava-se em queda, com MMS em torno de 2,0. As SE posteriores ao decreto de flexibilização apresentaram aumento rápido e expressivo, o qual se estendeu até a 53.ª SE com a MMS mais alta do período (33,71).
Observou-se, também, que em dois momentos do período analisado, houve a necessidade de intervenção do Ministério Público de Minas Gerais para barrar medidas de flexibilização. Um destes decretos foi o de n.º 8.765, o qual revogou as restrições anteriores, liberou o funcionamento de todos os estabelecimentos comerciais e determinou que o município não seguiria mais as diretrizes do Plano Minas Consciente a partir do dia 13 de julho de 2020.
Além da dinâmica da MMS dos casos de Covid-19 de São João del-Rei - MG, o estudo buscou representar a dinâmica intraurbana de contágio, letalidade e fazer associações.
Os bairros que apresentaram maior número real de casos confirmados foram, obviamente, os mais populosos. No entanto, analisar o número total de casos não condiciona a uma resposta espacial, pois a relação torna-se óbvia ou diretamente proporcional. Assim, os números percentuais apresentam respostas mais claras sobre a dinâmica espacial da doença.
Desse modo, identificou-se que bairro Jardim Central, apesar de menos populoso, com menor densidade demográfica e de domicílios, maior rendimento salarial e menor número total de casos, apresentou maior percentual de casos positivos de Covid-19. Na sequência, estão os bairros: Colônia, Bonfim, Centro, Tejuco, Matosinhos, Senhor dos Montes e Fábricas (Figura 2) (Tabela 1).
Quanto a letalidade, até 24 de março de 2021, foram confirmados 71 óbitos relacionados a Covid-19 no município, sendo 2 em distritos e 69 no perímetro urbano. Destes, 27,5% ocorreram no bairro Matosinhos, o qual apresenta o maior número de casos, de habitantes e densidade demográfica. No entanto, o percentual de óbitos, dentre os infectados, foi maior nos bairros em que a renda mensal média é menor, como o bairro Senhor dos Montes (Figura 2) (Tabela 1).
Figura 2: Percentual de casos e de óbitos por Covid-19 em São João del-Rei até 24/03/2021. Elaboração: Autores, 2021.
Tabela 1: Percentual de casos e óbitos por COVID-19 (por bairro) em São João del-Rei e informações demográficas.
Fonte: IBGE. 2010/Boletim Epidemiológico de São João del-Rei. Elaboração: Autores, 2021.
Os resultados da análise reforçam a importância de políticas ativas e consistentes no combate à pandemia, sobretudo, no que se refere às medidas de restrição e isolamento social. Além disso, reforça as considerações de pesquisadores, como César Simoni (2020) em um estudo desenvolvido em São Paulo, em que o padrão socioespacial da Covid-19 reflete as desigualdades sociais, com maior acometimento de populações de baixa renda.
[1] Doutorando em Geografia pela Universidade Estadual Paulista – Campus Rio Claro – E-mail: andreribeirogeo@gmail.com
[2] Professor Adjunto do Departamento de Geociências e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de São João del-Rei. Integrante do OBESC/NESC – E-mail: mtoledo@ufsj.edu.br
[3] Doutor em Anestesiologia pela Universidade Estadual Paulista – Campus Botucatu – E-mail: murillogsantos@gmail.com
[4] Análise referente ao perímetro urbano, não considerando distritos.