Fica decretado que agora vale a verdade
agora vale a vida
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.
(MELLO, 1964)
Escolhi cursar Psicologia na Universidade Federal de São João del Rei sem saber muito o que era a Psicologia, onde ela atuava, como atuava e ainda me faço as mesma perguntas. No começo me vi perdida, com várias matérias que não sabia aonde ia dar, mas também me vi apaixonada, me vi querendo entender os textos, discutir filosofia, entender sociologia, já que no ensino médio público a formação era bem fraca. Passei por muitas matérias sem entender sua finalidade, mas hoje consigo perceber a importância de ter tido matérias como Bases Epistemológicas, que me deixaram doida, mas me plantaram uma semente de curiosidade na cabeça, que vem sempre precisando de água pra nutrir.
No segundo ano de faculdade tive certeza de que queria continuar estudando Psicologia, a matéria de Psicologia Social fez a semente germinar apesar da dificuldade de crescer, da terra árida, do sol forte e da falta de água em momentos de desconforto com a realidade. Essa matéria me fez pensar a realidade social e a própria Psicologia, me fez querer acreditar em um novo mundo, apesar da dureza da teoria e da realidade.
No semestre seguinte, tive contato com a primeira matéria que iria me situar em um campo mais prático, com propostas para interferir e mudar a realidade. Em Psicologia e Saúde Pública tive contato com o SUS, com o seu surgimento e desdobramentos. A partir daí pude pensar a Psicologia dentro do Sistema Único de Saúde e a reforma psiquiátrica como um marco na Saúde Mental. Posteriormente, em Psicologia Comunitária consegui visualizar a Psicologia Social de forma mais suave, ainda fazendo as críticas de como ela vem se estruturando e a serviço de quem ela tem se colocado. Assim como em Comunitária, em Psicologia nas Instituições de Saúde, vi a atuação da Psicologia dentro da Rede de Atenção Psicossocial na promoção de saúde de grupos vulneráveis buscando ter ações articuladas e efetivas. Nesse percurso acadêmico me vi intrigada com várias questões, me vi admirada com as possibilidades de mudanças e tenho me encontrado na possibilidade de lutar pela saúde. Além destas matérias, a disciplina optativa Produção de Saúde, Normalização da vida e práticas de autonomia trouxe para a discussão as noções de saúde/doença e normal/patológico, assim como a ideia de biopolítica e biopoder.
Um dos momentos que me deu mais força e vontade de seguir um caminho dentro do SUS foi a 1 Conferência Nacional Livre de Juventude e Saúde, que contou com uma programação bem extensa, com temas como Inovação, Tecnologia e Ética na Pesquisa, a transformação que vem da prática: a experiência dos jovens no VER-SUS, o papel da juventude na defesa da Democracia e do SUS, entre outras mesas. Todas elas foram incrivelmente mobilizadoras, tive contato com pensamentos diferentes e alguns até bem parecido, mas de diversas regiões do país, e pude perceber a luta cotidiana que tem acontecido em cada canto. A experiência do VER-SUS me chamou muita atenção, pois aproxima estudantes de diversas realidades, promovendo uma interprofissionalidade e intersetorialidade em espaços diversos, onde é possível o diálogo e a problematização, onde os participantes aprendem com o cotidiano, com o outro, com o corpo.
O PET (Programa de Educação pelo Trabalho) foi uma das recentes experiências que tive, sendo este um trabalho semelhante aos programas de extensão, que trabalham com o compartilhamento de saberes com um grupo composto por professores, preceptores, que são profissionais da rede de saúde de São João del Rei e alunos. Em dois anos de programa muitos frutos foram possíveis, no Eixo Políticas de Saúde do qual fiz parte buscamos nos guiar pelos princípios do SUS, de Universalidade, Equidade, Integralidade e Direito à Informação para discutirmos e embasamos nossas discussões. Nesse tempo, uma das experiência que mais me marcou foi uma discussão que aconteceu durante uma das reuniões, onde uma aluna defendia que apesar das Políticas de Saúde da Mulher, Políticas de Saúde da População Negra e Política de Saúde da População de Rua muitos atendimentos ainda são negados a essas população, ou muitas são as negligências que acontecem. Indo de encontro aos princípios vemos que estes ainda estão em percurso de serem plenamente efetivados.
Apesar da situação tensa, pudemos aprender muito, com um exemplo vivido do que acontece em muitos lugares e que não deveria acontecer, isso nos marcou e destacou como é preciso se posicionar e tensionar questões que são pertinentes à luta por uma saúde universal, gratuita e de qualidade.
MELLO, de T. O Estatuto do Homem. (Ato Institucional Permanente). Artigo I Abril de 1964. Disponível em: <http://www.vidaempoesia.com.br/thiagodemello.htm>
[Bárbara Diniz Viana. Estudante de psicologia da UFSJ. Integrante do Estágio Extensionista no OBESC-NESC. 08 de julho de 2021]. Diários da Educação: Série Extensão Universitária.
Fotografia: Luana Kaori Saito
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