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Subnotificação em tempos de pandemia

Atualizado: 15 de set. de 2021

Saber corretamente o número de infectados pelo novo coronavírus Sars-Cov2 é fundamental para controle da epidemia. Dados corretos fornecem um recorte condizente com a situação atual e permitem criar estratégias para combater a disseminação da doença.


Segundo estudo da London School Of Hygiene and Tropical Medicine (2020), 9 entre 10 casos de Covid-19 não são detectados no Brasil. Para esses pesquisadores, o Brasil detecta em média entre 10 e 11% dos casos sintomáticos de Covid-19, ou seja, somente um décimo das pessoas portadoras do vírus e sintomáticas são registradas pelo governo. O estudo britânico se baseia em um modelo matemático que usa como referência a taxa de letalidade do coronavírus na China, definida em 1,38%, após ajustes feitos pelos pesquisadores daquele país. Os britânicos ajustaram, da mesma forma, as taxas de letalidade do Brasil e de outros 26 países e compararam-nas com a da China. Se a taxa ajustada for maior que 1,38%, isso sugere que apenas uma fração dos casos foi registrado.


Além disso, um estudo brasileiro feito por pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP (FMRP USP) indicou em 07/05/2020 que o número real de casos de Covid-19 é superior a 1,6 milhão no Brasil, ao passo que, segundo o Ministério da Saúde, nessa mesma data, o número de casos notificados foi de 135.106. Ou seja, teríamos cerca de 10 vezes mais casos de coronavírus na realidade do que os realmente notificados e divulgados. O método utilizado por esses pesquisadores também analisa uma taxa de letalidade ajustada e conclui que a taxa de subnotificação é de cerca de 93% no país. Esses mesmos pesquisadores também fizeram uma estimativa de dados de subnotificação por estado, resultando no quadro a seguir.



Outra indicativa da gravidade da subnotificação de Covid-19 no Brasil é uma notícia da UOL que aponta, a partir de denúncias feitas por profissionais da saúde, que suspeitas de casos de coronavírus são registrados como síndrome gripal. Esses profissionais atuam em uma UPA na Cidade de Deus (RJ) e denunciaram a subnotificação de ao menos 40 casos de pacientes com suspeita de terem contraído o novo coronavírus. Quatro deles chegaram a ser internados em estado grave e, por isso, tiveram os seus nomes retirados do sistema. Nesse sentido, os médicos relatam que há um recado em frente a seus computadores sugerindo o diagnóstico de síndrome gripal adotado pela CID. Portanto, há um foco de coronavírus na Cidade de Deus, que não aparece nas estatísticas por causa dessa subnotificação de casos suspeitos.


Além disso, existe uma grande subnotificação no número de mortes pelo novo coronavírus. Segundo reportagem da Pública - Agência de Jornalismo Investigativo - todo cadáver, com suspeita ou não de infecção pelo Covid-19 para devida emissão da Declaração de Óbito deve ser usado o termo “causa indeterminada neste momento”. Para a reportagem, foi entrevistado um funcionário do Serviço de Verificação de Óbitos da cidade de São Paulo (SVOC). Ele não soube precisar quantos corpos passaram pelo serviço nesta semana, porém aponta que a situação é reflexo da decisão do Governo Estadual do último dia 20 de março. Na data, uma portaria definiu que corpos envolvendo mortes suspeitas por Covid-19 ficam sob responsabilidade do serviços de verificação. Contudo, para proteção dos profissionais, eles podem evitar exames invasivos e registrar as mortes como “causa indeterminada neste momento”. Resultado disso, foi que houve um aumento de 43% das notificações de mortes por “causa indeterminada” quando comparado ao ano anterior. Embora seja, de fato, importante que os profissionais mantenham-se protegidos, é preciso que a causa da morte dessas pessoas seja investigada de modo seguro, como forma de respeito às famílias e à população, que merecem informações corretas acerca do novo coronavírus.


Outro indicativo dessa subnotificação das mortes é que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o Ministério da Saúde, atualmente, autorizam enterros e cremações sem atestado de óbito na hipótese de ausência de familiares ou pessoas conhecidas do obituado. A Portaria Conjunta 1/2020 autoriza estabelecimentos de saúde a encaminhar para o sepultamento ou cremação os corpos sem prévia lavratura do registro civil de óbito.


Nesse sentido, ressalta-se a importância de uma notificação correta dos números de caso e mortes pelo novo coronavírus. Também existem diversas notícias falsas, as “fake news”, que divulgam a existência de uma super notificação - inexistente - dos casos. É importante que a população entenda a dimensão da situação atual para não enxergar somente a ponta do iceberg. É necessário lidar com os números mais próximos da realidade possíveis, porque precisa-se estimar corretamente quais capitais precisam de mais suporte; definir quais áreas de fato devem estar isoladas; além de otimizar as políticas públicas que podem combater a pandemia, amenizando seus efeitos na saúde e na economia.



Beatriz Gomes, estudante de medicina da UFSJ. Estagiária do OBESC, 2020.


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