A dois quilômetros do campus da universidade se encontra a unidade de saúde, a 500 metros, subindo o morro, à esquerda do pé de mamona, fica a casa da dona Maria. Subimos para a visita sem muita expectativa de encontrá-la em casa. Ela não gosta de sair de casa, mas não gosta de cobrança e quando a agente comunitária disse que íamos visitar, Dona Maria havia dito que ia sair. A casa é simples, uma porta apertada, e no fundo vemos algumas galinhas. Ao chegar, batemos na porta, prontas para ficar decepcionadas, mas ela nos recebeu de avental e mãos geladas. Sentada no sofá de sua sala, revisamos os medicamentos que ela deveria estar tomando e conversamos sobre a ida do esposo no CAPS. Ao terminar de organizar a lista de medicamentos e conversar sobre suas idas aos grupos de fuxico, Dona Maria foge do assunto falando de amenidades. As galinhas engordaram. O crochê parece que rendeu. Ao observar a sala vemos que ainda não se desfez das caixas antigas de medicamentos. Conversamos com a agente comunitária de saúde, que diz que ela vai esquecer tudo e que nunca resolve apenas conversar. Marcamos a próxima visita. Não me recordo de tudo, mas recordo que foi uma tarde de segunda-feira agradável.
Hoje, 2 anos depois, me vejo pensando nessa visita domiciliar e no método, que método foi esse, onde se encaixa na caixa de certezas que é o método científico. Objetivos, roteiros, faça isso e faça aquilo. Hoje com a extensão chegando como parte do currículo me pergunto como vai ser esse contato para aqueles que vierem depois de mim. Sentar no sofá? Falar das galinhas? Comentar do crochê que ela estava fazendo? Ou passar uma lista do que ela deve fazer para continuar no projeto? Se ela não cumprir e “esquecer tudo” simplesmente cortar sua participação? Como chegar com uma lista pronta, regras, sem tensões, sem a reflexão e o diálogo?
Como vai ser a extensão naquelas disciplinas, matérias, no qual uma metáfora incomoda tanto quanto uma capa em wordArt? Que tipo de extensão teremos? Seremos atores envolvidos que refletem ou apenas cumpridores de mais um roteiro? A pesquisa-ação se tornará mais uma receita a ser seguida, formatada no fim do semestre e empacotada como relatório para aprovação?
[Yasmin Carli. Estudante de psicologia da UFSJ, integrante do Estágio Extensionista no OBESC. 01 de julho de 2021].
Fotografia de João Lino. Estudante de medicina da UFSJ.
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