"Enquanto dormem, nós sonhamos", de Fernando Campos Maia. Mais obras do artista podem ser encontradas no Facebook: Atelier Virtual - Fernando Campos Maia ou no Instagram: @fernandocamposmaia".
Quando soube da notícia do covid-19 no Brasil e logo em seguida da suspensão das aulas, foi como se abrisse, instantaneamente, uma fenda que dividisse ao meio a imagem que sustentava a minha visão frontal. Tudo começou a ficar ofuscado. Era como se um buraco imenso se expandisse, tomando conta dos quatro cantos do mundo. O céu, as ruas, os prédios e casas. Imagens do mundo concreto se tornando nebuloso, breu. Planos, projetos, laços, dias, compromissos, vidas. Iam-se desabando um a um, sem ao menos um aviso prévio, um sinal de alarde. Minto, já estávamos ouvindo gritos há alguns quilômetros de distância, só não queríamos, era mesmo, escutá-los. Resistimos. Talvez pela ridícula pretensão humana, de hesitar em desviar o olhar do próprio umbigo para poder visualizar com mais cuidado ao que já mostrava se manifestar de forma cruel e contagiosa. “Ah, mas está tão longe, né? não vai chegar até aqui”, ouvi. É, chegou. E sem medir esforços. O vírus fez o trabalho de expor as vulnerabilidades humanas, que muitos de nós têm evitado arduamente em esconder, em apenas alguns dias. Sim, um ser não vivo e microscópico fez com que uma parcela da população se deparasse, pelo menos nem que por alguns segundos, para crateras macroscópicas do social e de nós mesmos que, iludidos, tentávamos tapar com massinha de pastel. Eu, particularmente, fui confrontada a olhar para todos os meus buracos internos nesse período de quarentena. Não é fácil. Não está sendo, mas é preciso fazer. Aceitá-los com acolhimento. Talvez só assim, conhecendo-os melhor, posso fazer brotar vida em meio a esse caos.
[Daniela Marras, estudante de psicologia na UFSJ. 12 de maio de 2020.]
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