A quarentena começa depois da volta da minha depressão
No início foi bom voltar pra casa e me distanciar dos problemas
Porém ao se chegar no fundo do poço, nem estar longe dos problemas antigos adianta
Para curar a depressão é necessário distração, diversão, alguns remédios e exercícios
Amigos são bons nessa hora mas não poder vê-los dificulta.
O problema está em ficar sozinho, com a mente desocupada e sem nada pra fazer
Ligo a TV pra me distrair e só vejo desgraça, penso em sair mas lembro que não posso
O que fazer? Como passar o tempo? Como ocupar minha mente ociosa?
Já dizia minha avó: “Mente vazia é a oficina do diabo”
O diabo sou eu manifesto na ansiedade que cria problemas e a depressão entristece.
Tento criar uma rotina para me ocupar todas as horas do dia
Ler, escrever, desenhar, comer, jogar, conversar, me exercitar, tomar sol e me medicar
Porém tudo enjoa, tudo cansa, tudo perde a graça e me vejo novamente onde comecei
Tentando me acalmar e acostumar com a rotina
Minha vantagem sempre foi manter a calma.
Com o tempo me acostumei ao isolamento, me afastei das notícias e aderi a rotina
A volta as aulas foi ótima para me ocupar
Estudar as sociedades do passado e se afastar do mundo presente
Porém o presente foi me chamar de volta da pior forma
Com a notícia que o pai de um amigo não estava mais entre nós.
Funeral, pandemia e depressão
A pior combinação possível
A vida nunca foi tão frágil, e tão preciosa ao mesmo tempo
Foi um dia triste pra mim e minha família, mas bem pior para meu amigo e sua família
Os dias se passaram, a tristeza se diluiu e eu voltei pra minha rotina.
A quarentena afrouxou-se e pude ver alguns amigos
Distanciamento, máscaras, preocupação com a transmissão do vírus, mas havia alegria no ar
Os poucos momentos que pude sair e me divertir com eles foi a injeção de serotonina que me faltava
Me fez lembrar de antes do Covid-19
Quando meus demônios ainda existiam, mas viver era menos complicado.
Sou puxado de volta a realidade ao saber que um amigo meu perdeu seu irmão
A mesma doença que me atormenta levou o irmão do meu amigo
Volto ao mesmo cemitério, os sentimentos negativos que lá tive retornam com tudo
Ao ver alguém que sempre foi alegre em um momento de tristeza, entristece qualquer um
Aquela desagradável combinação se repete e a tristeza volta.
Os dias passam, o comércio volta e eu volto para São João del-Rei dar continuidade a auto-escola
Ver amigos de vez em quando, aulas da faculdade e aprender a dirigir. Parece que a vida está voltando ao normal apesar dos pesares
Mas outra vez sou lembrado de que a vida não é como antes
Perco uma amiga próxima a mim, não foi a Covid-19 que a levou
Novamente a doença que me perturba leva mais uma pessoa querida.
Essa notícia me impactou mais ainda por eu estar longe e não poder dizer adeus
Era um dia feliz e ensolarado que se tornou triste e nublado
Não muito tempo depois de me recuperar desta notícia sou recebido com outra
O pai de outra amiga próxima é levado pela Covid-19, me dói ver alguém próximo sofrer
E o pior é não poder estar lá para demonstrar meu apoio neste momento difícil.
A vacinação avança, eu volto pra minha casa matar a saudade do lar
Penso que as coisas estão caminhando para um futuro melhor
Até que novamente recebo outra notícia indesejada
Meu tio-avô estava entubado e podia não voltar
Apesar de não ser tão próximo dele, não queria perdê-lo.
Mas está além da minha alçada, e ele se vai junto de milhares acometidos deste vírus
Todas estas perdas ao longo de um ano e meio de quarentena me fragilizaram por dentro
Comecei a valorizar mais aqueles que estão ao meu lado
Ver a vida de forma diferente
Compreender que mesmo que alguns nos deixem, nós que aqui ainda estamos devemos seguir em frente.
[César Manzanete Carnevalli. Estudante de História na UFSJ. Narrativa desenvolvida durante a disciplina Memória, corpo e narrativa. 21 de agosto de 2021].
Fotografia: Nadiia Ploshchenko (Banco de imagens Unsplash)
Nota para a publicação da narrativa: Através desta nota gostaria que todos que lerem minha narrativa saibam que a vida não é somente decepções e amargura, sempre há uma luz no fim do túnel. E enquanto não chegamos lá devemos nos agarrar às pequenas coisas do dia a dia que nos fazem bem, é possível encontrar alegria, paz e amor em meio a este caos. Nesta narrativa eu procurei exprimir meus sentimentos sobre a pandemia e como ela afetava meu estado psicológico, que já não estava tão bem. Foquei nos acontecimentos que mais me impactaram ao longo da quarentena e deixei de mencionar alguns acontecimentos que me trouxeram muita alegria. Em meio a esta pandemia eu pude encontrar conforto e o amor de uma pessoa incrível, além de me aproximar mais dos meus pais e aprender a valorizar os momentos de alegria, por que mesmo que eles sejam poucos eles existem. Espero que através desta narrativa em que eu demonstro minha fraqueza, vocês possam encontrar força para continuar, sabendo que vamos sair dessa juntos.
Atendimento gratuito no Centro de Valorização da Vida (CVV): 188
Site do CVV: https://www.cvv.org.br
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