Logo no início da pandemia subestimamos o que viríamos a enfrentar nos meses seguintes, achávamos que seriam 15 dias ou no máximo um mês de confinamento, e sem seguida retornaríamos ao nosso cotidiano comum e com poucas alterações, e até o fim do ano o confinamento já seria história, algo distante e ficaria para trás. Mas as coisas não aconteceram bem assim, semanas se tornaram meses, surgiram picos em diversos momentos ao longo do período, variando a região de incidência e o número de afetados, mas continuando em um patamar preocupante, de insegurança de incerteza.
Inicialmente resisti em retornar para minha cidade natal por achar que tudo voltaria ao normal rapidamente e nas poucas saídas de casa para ir ao mercado experimentei a cidade de Tiradentes como nunca antes vista. O cenário me parecia irreal, uma transformação do dia para a noite, com as ruas e casas antigas intocadas, como uma cidade fantasma. Percorria aproximadamente dois quilômetros para ir ao mercado e não encontrava ninguém nesse percurso, parecia que a cidade histórica havia sido evacuada em instantes e que apenas eu havia ficado para trás. Três semanas se passaram e resolvi que era hora de ficar com meus pais, voltar para casa. Durante todo o caminho me senti novamente em um filme, estradas vazias, pontos de paradas fechadas e ninguém à vista, um cenário realmente apocalíptico.
Ao chegar em minha região me deparei com dois cenários, a cidade que é o polo central da região se encontrava com tudo fechado e população respeitando o isolamento, mas na cidade em que minha casa se localiza de fato as pessoas ainda não estavam compreendendo a gravidade da situação e as ruas, sorveterias e bares continuavam cheios e sem medidas de afastamento social ou higiene adequados para os tempos pandêmicos.
Minha rotina transformou-se em uma constante repetição de não fazer nada o dia inteiro, só assistindo noticiários e sendo cada vez mais improdutiva, insegura e sem perspectiva de futuro. Comecei então a tentar criar hábitos, pequenas coisas que faria todos os dias como estudar, ler, rezar, exercitar-me como uma tentativa de preservar minha saúde física e mental, que já estavam pedindo socorro. Coloquei para mim mesma que tomaria todas as precauções possíveis quando necessário ir à rua, mas que enquanto estivesse no conforto de minha casa não me preocuparia com coisas externas às minhas capacidades de resolução ou controle, mas garantiria que minha parte estava feita e então tentaria ignorar as neuroses com possíveis possibilidades de contaminação.
Esse tempo em domicílio me levou a me sentir muito grata por tudo, e me vi agradecendo por tudo o que tinha e sem lamentar o que havia perdido com a pandemia. Sentia-me grata por ter uma casa grande e com áreas externas onde eu conseguia ter um contato com a natureza e renovar o frescor e a sensação de estar do lado de fora, mas meu pensamento se concentrava também naqueles em que estavam confinados em apartamentos pequenos e impessoais sem a possibilidade de um encontro maior com a natureza em um espaço privado.
Com o confinamento, passei a apreciar muito ter um grande contato com a natureza e comecei a fazer caminhadas em estradas rurais, passar mais tempo lendo ao ar livre e em alguns dias transferia minha área de trabalho para a varanda para mudar os ares e me sentir mais livre enquanto cumpria com as minhas obrigações. Ainda há a falta de contato com as pessoas, de encontra-las todos os dias e voltar a movimentada rotina diária pela cidade, poder perambular e sentir os espaços urbanos como antes, mas aos poucos e com precaução vamos voltando com pequenos passos às rotinas comuns.
Refleti durante esse período principalmente sobre a vida, como não temos controle e nem certeza de nada e como um pequeno fato pode mudar o rumo da vida de uma pessoa para sempre. Momentos são efêmeros e compõem uma lista de acontecimentos que designa o tempo, períodos, acontecimentos que vem a ser guardados apenas nas memórias das pessoas como coisas que ocorreram no passado, o presente vira passado a cada segundo que vivemos e pensar nessa velocidade da vida pode se tornar um fardo muito grande. Viver intensamente os momentos que nos são propostos é uma forma de tentar aproveitar mais, ver o lado positivo das coisas mesmo que o cenário seja inacreditavelmente caótico pode ajudar com a criação de uma perspectiva de futuro mais sólida e positiva, ajudando assim o enfrentamento do presente momento e dando forças para continuar cada vez mais, vencendo um passo e um dia de cada vez.
Ana Carolina Hott, Discente do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFSJ, 14 de dezembro 2020
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