Fotografia de João Guilherme Lino da Silva. Disponível no Instagram @oniloaoj. Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar em São João del Rei – tempo Quaresmal, introspectivo, tal qual esse tempo atual.
Efêmero? Foi para quem apenas existiu naquele período. Não para os que sofreram as maiores consequências. O dano mental/pessoal ainda machuca – será que as feridas vão cicatrizar? Os livros de história contam uma e/ou outra visão individual – mas as estórias de fato contam a realidade. Ainda existe certo receio em iniciar esse tipo de assunto em uma roda de conversa. Artigos múltiplos aparecem em tudo que é meio de comunicação científica – filtro continua sendo importante na busca por informações reais e relevantes. Os números da economia ainda refletem na vida de muitos (fica em casa e depois a economia a gente resolve? Não era tão fácil né?!). Falou-se uma vez em “marolinha” para uma crise; o ruflar de asas de uma borboleta é capaz de criar um tornado do outro lado do mundo; nem todos os cabelos foram assanhados de maneira inocente ... alguns se perderam – e cresceram – outros jazem na frialdade inorgânica da terra (Ah, Augusto dos Anjos! Tão atual ...). Meu travesseiro ainda ouve soluços. Como a nossa mente é capaz de nos fazer tão mal em meio ao caos?! A Azitromicina já perdeu de vez seu efeito. O uso desenfreado selecionou todos os organismos possíveis com resistência. Um remédio tão bom e barato perdeu seu valor às custas do uso desenfreado (e nem sempre necessário). Ainda bem que Vitamina D não seleciona organismos e Hidroxicloroquina tem seu lugar de destaque na Dermatologia e na Reumatologia (de onde não devia sair!). Ainda preciso de psicotrópicos e indutores de sono – será que isso vai passar? Não tive lápides para chorar – graças a Deus não precisei. No entanto, ainda me dói pensar em quantos não puderem realizar uma digna despedida para os seus. Muitos já esqueceram. Para quem isso tudo foi só uma “marolinha”, o tempo já parece remoto e os traumas são vagos. Ainda se teme o isolamento – só para quem cumpriu. Aquela rotina de excesso de lavagem de mãos, uso de álcool, máscaras e 50000 tipos de desinfetantes – e desinfestantes – voltou a cair em desuso. Parece que não aprendemos que grande parte dos nossos problemas começa com a falta de higiene. O trabalho remoto voltou a ser “desculpa de preguiçoso” e os congressos voltaram a custar “os olhos da cara” e obrigatoriamente presenciais. Houve um tempo ... De fato houve um tempo. Muitos lembram, muitos esquecem, muitos temem, muitos negam. Fui perguntado esses dias sobre como amei em tempos de crise. Amei sem contato. Amei amando. Amei sem demonstrar. Amei demonstrando. Amei sentindo. Amei à Mário de Andrade – de maneira intransitiva – Amei (cuidei, preocupei, telefonei, chorei, emocionei ...). O tempo passou. A vacina chegou. A cura é possível. Agora temos tempo (ou voltaremos a reclamar não ter tempo e possibilidades?). O tempo é todo nosso, como aquele delicioso recheio de bolo que escorre pelos cantos da boca e eu concordo com o que foi dito: “Só vai perdurar o que se sentiu!”
[João Guilherme Lino da Silva. Estudante de Medicina da Universidade Federal de São João del Rei. 17 de outubro de 2020]
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